segunda-feira, 7 de maio de 2012

Metal e punk dividem espaço em bairro nobre de BH


Belo Horizonte testemunhou no último sábado de abril, 29, um lance pra lá de especial: o Gig Punk, festival que ocorreu na histórica praça Duque de Caxias no bairro Santa Tereza. Foram reunidas atrações da cena punk e metal, como Martyrizer (Grind, BH), Execradores (Anarco-punk, SP), Tuna (Punk rock, SP) e Metrliator (Thrash, BH). O evento trazia a promessa da união de públicos que historicamente se aventavam como inimigos, perpetrando lendárias “tretas” nos idos dos anos de 1980 e 90. Apesar das controvérsias, os shows transcorreram numa boa e o público ficou ensandecido apenas para corresponder à energia descarregada pelas bandas no palco. Houve um desentendimento, aparentemente entre punks e skinheads, na praça, relatado por pessoas presentes no show, mas foi algo isolado que não teve nenhum tipo de relação direta com os gigs, apesar de deixar uma certa tensão no ar. No mais, foi uma noite de contrastes bem interessantes. A casa que recebeu as atrações é o tradicional espaço Recanto da Seresta que, como seu nome indica, está acostumado a receber atrações ligadas à música popular brasileira. Era muito interessante ver estandes de vendas de camisetas, zines, discos em vinil, CDs e material em geral, além de shows punks e de música extrema em meio a fotos de artistas nada a ver, como Dominguinhos. Isso sem falar no próprio cenário que é Santa Tereza: um lugar onde ainda reinam o tradicional (igrejas, arquitetura antiga) e o boêmio; um bairro que conserva um charme cultural (resquício da aura de movimentos culturais como o Clube da Esquina, artistas etc.) e é também um dos grandes centros irradiadores do metal mineiro, pois é o berço do um dia fantástico Sepultura. Uma atmosfera bacana cheia de imagens e lembranças do cenário cultural mineiro e nacional.

Infelizmente, por conta de contratempos, não pudemos presenciar o show dos mineiros do Martyrizer. Quando adentramos ao local, o Metraliator dava os últimos toques na passagem de som. Muitas pessoas encontravam-se do lado de fora, tomando cerveja antes do show, já que o ingresso em forma de carimbo permitia isso nos intervalos entre as apresentações. Quando os primeiros acordes soaram a casa encheu subitamente. Com o espaço lotado o ritual de pancadaria thrash teve início. A banda pratica um retro-neo-black-thrash (ou speed “evil” thrash metal, como eles mesmos preferem) calcado nos anos 1980, particularmente na diabólica trindade alemã (Destruction, Sodom e Kreator). E aquilo que poderia se tornar pastiche idólatra cheio de clichês, acabou sendo um show divertidíssimo, com músicos afiados que fazem uma leitura muito bacana e particular do som oitentista – e não uma mera cópia vazia. A violência e rapidez dos riffs da guitarra de Paulo, somadas à cozinha de Canário (baixo) e Misantropic (Bateria), nos lembram de que punk e metal têm mais afinidades do que supõem os detratores preconceituosos de ambos os lados. Em vários momentos, o vocalista Rock´n Roll desceu e cantou no meio da plateia, assim como o público também subia no palco. Comunicativo e simpático, entre as músicas sempre fazia comentários sobre a união entre metal e punk, e a possibilidade de resistência subjetiva num mundo pra lá de escroto. Uma verdadeira aula sobre a fusão entre os estilos que redundou no metal extremo.

Depois do Metraliador foi a vez do Tuna, projeto formado por membros dos Execradores – Josimas no baixo e Paulo na guitarra, ambos trocando os instrumentos que usam na sua banda de origem. Punk rock experimental, com várias influências que vão do post-punk ao noise, passando pelo rock alternativo e elementos crust/d-beat. A performance da vocalista Andreza é um caso a parte. Com visual agressivo, de cabelos curtos e esbanjando sensualidade, a moça tinha atitude para dar e vender, se contorcendo, andando pelo pequeno palco de lá para cá ou cantando no meio da galera. Seu timbre vocal lembrava um pouco a cantora Rosália do falecido grupo oitentista pós-punk paulista, Mercenárias. O Tuna, alias é formado por excelentes músicos, possuindo uma aparelhagem bem bacana (guitarras semi-acústicas, baixo rickenbaker, fender telecaster), e executando composições que, apesar da tosquice, exibem uma sofisticação vanguardista sem igual. No final do show, o grupo arriscou um experimento totalmente noise baseado em microfonia obtida a partir dos pedais e outros efeitos de guitarras. Um grande show, apesar do esvaziamento da casa – boa parte da moçada foi tomar golo do lado de fora – e de alguns probleminhas técnicos com o som.

Quando os Execradores subiram ao palco a casa se encontrava com sua lotação esgotada. Podiam-se ver pessoas que ostentavam camisetas que iam de Darkthrone, passando pelos heróis do crust Doom, chegando até o Velvet Underground. Ou seja, um público bastante heterogêneo se encontrava no local. Ameba, do Attack Epiletico subiu ao palco e fez as honras de mestre de Cerimônia, anunciando o armmagedon sônico da banda. No seu discurso, falou sobre a importância da união entre punks e bangers (ideia propagada por praticamente todos envolvidos no festival, sejam músicos ou organizadores) e ainda cuspiu veneno contra racismo, sexismo e outros males e enfermidades que assolam nossa civilização. A banda então iniciou seu som, carregado de influencias punk, d-beat, crust e hardcore. Cada intervalo entre as músicas foi pontuado pelo discurso com sólida base anarco-punk, do vocalista e guitarrista Josimas. Um exemplo é “Sistema Familiar” porrada sobre a opressão da instituição da família burguesa. O som dos Execradores, banda que já tem 21 anos de carreira, é mais direto que o do projeto Tuna, de base mais experimental. Vale lembrar que o vocalista e guitarrista Josimas e o baixista Paulo voltaram aos seus instrumentos de origem. A plateia também compareceu em peso se tornando um espetáculo na demonstração de energia, com personagens históricos do punk belorizontino entrando no mosh, que pegou fogo. Ao final da apresentação, antes das 22 horas, todos se retiraram do local, sem maiores incidentes, demonstrando bastante organização. Um final feliz para uma noite que ultrapassou o preconceito e provou ser possível que soldados underground urbanos, como os punks e bangers, podem se unir e se divertir, construindo alternativas contra o “pão-e-circo” do opressor.


Set Lists:

MARTYRIZER

1-TO DISTORT THE WORLD

2-GRINDCORE IS FREEDOM

3-SICK MUSIC TO AN EXTREME WORLD

4-SUMMER HITS

5-DEMISE

6-REFUGE

7-FIGHT FOR NOTHING

8-DESTROY PASARGADA

9-THE VOID BOTHERS YOU

10-CRIES OF DESPAIR

11-MASKED FACES

12-THE DOGS BARK AND THE BULLET'S DON'T STOP

13-NEURO COLLAPSE

METRALIATOR

1-EVIL MASS

2-SATANIC ANARCHY

3-BESTIAL FORCE

4-SPEED METAL MACHINE

5-METRALIATOR

6-MISANTHROPIC/MOTORBANGER

7-BANISH THE FALSE

8-SEXUAL VIOLENCE

9-PUNK METAL OLD SCHOOL

10-THE ROAD NIGHTMARE

11-KILL THE OPRESSION

TUNA

1-ISMAEL NO AMPLIDIFICADOR

2-QUERO FICAR NO SEU CORPO FEITO TATUAGEM

3-DE PERTO, O MUNDO DIVERSO

4-ANTES SER O CIO QUE A REGRA

5-VOAR DA CIDADE

6-70% DE MAR

7-BOM DIA, CABEÇA DE NABO

8-APIMENTANDO O NOSSO

EXECRADORES

1-INTRO

2-ESPELHO

3-SEM FRONTEIRAS

4-OCUPAÇÃO

5-VIDA

6-CONSCIÊNCIA

7-ANIMAL II

8-SISTEMA FAMILIAR

9-FORÇA DE VONTADE

10-SER ADULTO

11-SUBVERTA

12-ALTERNATIVO

13-07/10/1937

14-CARRETEL

15-JUVENTUDE ANTIFA

16-POR QUE MORRER?

17-NATUREZA

18-PUNK

19-AO MILITAR

20-IGUALDADE

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