terça-feira, 17 de abril de 2012

O Curupira entrevista: Bozó (Overdose), parte I


Quando voltamos para os primórdios da história metálica belorizontina, impossível não deixar de citar uma banda em especial. No início dos anos de 1980, ninguém ainda tinha ouvido falar em Rock in Rio, e heavy metal era algo embrionário, de difícil acesso. Não obstante os percalços, vários grupos de cabeludos foram se formando, e deles bandas foram surgindo. A primeira delas com maior visibilidade foi o Overdose. Um quinteto que apresentou à BH o tradicional metal, com um toque de NWOBH, mais o pesado tempero mineiro, aquela tosqueira criativa, tão presente em todas as bandas que surgiram naquele período. Com quase 30 anos de estrada, são seis full-length lançados, que vão do supracitado heavy tradicional ao thrash. O primeiro trabalho foi o histórico Século XX, split EP, de 1985, com o famigerado Bestial Devastation, do Sepultura. Inclusive a logo em “S” tribal do quarteto mais famoso da cena nacional foi criada pelo sujeito que protagoniza esta entrevista. Pedro Amorim do Carmo, 45 anos, 20 deles como tatuador, mais conhecido como Bozó, é uma lenda viva do metal brasileiro. Carismático pra cacete e dono de um favorecido timbre vocal, o atleticano conversou com nossa equipe por quase uma hora, logo após concluir uma tatoo indígena de quase 30 centímetros na coxa de uma gatinha. Eis aqui a primeira parte da conversa, feita pelo repórter Oswaldo Diniz, em companhia de Daniel Cassin, dois representantes urbanos do ser da floresta. Se você tiver tempo, recomendamos ouvir o áudio que vem na sequência. Nele a entrevista vai completa, e é bem mais divertida. Nossa equipe conversou também com o baixista original, Fernando Pazzini. O bate papo será postado ainda nesta semana, assim esperamos.

O Curupira: Qual é a realidade do Overdose hoje?

Bozó: A banda (teoricamente) não existe mais, desde 1998, quando paramos. E fica a fissura, né velho? Eu tenho muita fissura de voltar com o Overdose, acho que infelizmente a questão de grana, uma porrada de banda daqui teve de parar por causa da grana. Eu não tenho vontade de voltar à ativa de novo, até mesmo porque estou com 45 anos, a galera na faixa dos 40, pra retornar teria de ser uma coisa mastigada, trilhar tudo de novo é foda. Por exemplo, o Zé Baleia está tocando com o Eminence, na ativa com força e tal. Pelo menos pra mim fica uma fissura fudida de fazer um show em BH, de azedar, de passar mal! Quero até aproveitar o espaço pra fazer um apelo pra convencer o Cláudio (guitarrista) pra fazer um show em BH... não precisa tocar em lugares como Chevrolet Hall, pode ser em algo menor, tipo Jack, Studio Bar. A ideia é dar sold out, pra zoar o plantão, sacou?

O Curupira: Não seria um retorno, e sim um revival.

Bozó: Exatamente, brother. O Overdose acabou? Não, só não estamos fazendo turnê, nem gravando mais. Tem uma galera que acompanha a gente há muito tempo, e outras que não conhecem. É interessante mostrar pra essa geração nova. Minha vontade é tocar uma vez por ano. A última vez que tocamos foi em 2008, na Virada Cultural de São Paulo, foi do caralho!

O Curupira: O que você acha que impossibilita esse revival?

Bozó: Não sei cara, o Fernandinho (baixista original) eu às vezes coloco o 38 na cabeça dele e obrigo ele a ver se faz. Não sei, o Cláudio às vezes fica com uns empecilhos e tal. Não tem mistério, cara. A gente ensaia, faz um ensaio legal... porra...

O Curupira: O que você mais sente falta da época de estrada?

Bozó: É tocar em lugar legal, com som legal. Lógico também os perrengues dão saudade porque engrossam o coro, é aprendizado. Banda é um puta casamento de aprender a lidar com o ser humano. Mas, principalmente, a saudade é dos shows em Belo Horizonte. Os shows do Ginástico eram bons pra caralho. Casa lotada, sempre tinha shows do Overdose com The Mist, Witchhammer, o próprio Sepultura.

O Curupira: Como é a relação hoje com esses caras das antigas?

Bozó: Ah, hoje em dia o Facebook ajuda muito, reencontrando a moçada. E é engraçado que tá todo mundo com filho, constituindo família e essa coisa toda, mas não parou. Isso que eu acho legal, por isso acho bacana o lance do revival. Em 2004, nós fizemos o Rock História, no Marista, com Angra e Shaman. Lembro que no dia seguinte uns moleques do (bairro) Santo Antônio me pararam e disseram: “vc que é do Overdose?” daí eu disse: “porra, bicho, vc é muito novo pra conhecer o Overdose”. “Não, eu fui lá no show do Marista”, achei do caralho, foi uma coisa que me deu um gás pra tocar de novo. Você vê que a galera nova curte mesmo.

O Curupira: Mas hoje nós vamos em shows e percebemos que a galera mais nova, abaixo dos 20 e poucos anos, diminuiu pra caralho. O que você acha que está atribuído isso daí?

Bozó: É, você não vê muito novo no metal. Nego novo curte som new metal, emo, essas porras, cara. O metal é essa geração mais nossa mesmo. É a questão de show, espaço que não tem tanto.

O Curupira: Por falar em show, queria que vc voltasse nos primórdios do Overdose. Como era no começo?

Bozó: Caralho, primeiro show do Overdose foi em um festival do Colégio Santo Antônio, chamado “Música de Banheiro”. Foi no dia 22 de outubro de 1983. Lembro que, assim, não tinha banda de metal, velho, bem restrito mesmo. O pessoal ficava olhando arregalado, achando estranho pra caralho. Chegava no final do show e a menina perguntava: ‘que que é isso aqui que vc fica fazendo com a mão toda hora?’. E eu respondia: é o símbolo do capeeeeta! E ninguém fazia isso, velho! Chifrinho hoje em dia, bicho, até o Justin Bieber faz. Até a própria tatuagem perdeu o romantismo.

O Curupira: Falando no assunto, como é a sua relação com a tatuagem?

Bozó: Eu gosto de tatuagem desde moleque mesmo. A primeira vez que o (espetáculo) Holiday on Ice veio a BH, os gringos ficavam na beirada piscina do Minas Tênis jogando frisby, com o corpo todo forrado (de tatuagens). Eu falei: que isso? Eu quero essa porra! Logo depois o Fantástico fez uma matéria sobre tatuagem. Eu desenhava os amigos com caneta bic, fui aprendendo com a tinta entrava na pele, tatuando meus primos com agulhinha, aí eu comecei a trabalhar em estúdio, fazendo desenhos pros caras e tal. Quem foi meu mestre foi o Marco Castro, o Marcão Tatoo.

O Curupira: Vocês estão sem tocar tocar desde 1998?

Bozó: Não, em 2008 nós participamos da Virada Cultural de SP, foi legal pra caralho. Depois da gente o Vulcano (considerada primeira banda extrema do Brasil) tocou. No backstage um olhava pro outro e gritava: ‘ahhhh, olha como o cara envelheceu, tá gordo pra caralho! Todo mundo rachando ...

O Curupira: E é isso que fica, vocês são cúmplices de uma geração com muita bagagem. Como que é carregar essa bagagem?

Bozó: Do caralho, experiência de vida, de lembrar das coisas, dos perrengues. Um exemplo é sobre instrumento musical. Antigamente era difícil, tinha Gianini, Fink, Felpa e só. Hoje em dia qualquer moleque tem uma fender e um marshalzinho. Nem vai pro estúdio, grava em casa e fica foda do mesmo jeito.

O Curupira: Ao mesmo tempo que isso dava muito trabalho pra vocês no passado, deve ser uma coisa legal porque, tudo que é conquistado com suor é gostoso pra caralho. A geração de hoje não tem tanto isso.

Bozó: Não tem não. Essa molecada pega o boi (entenda-se, tem sorte). E não é só na música não, no futebol e no skate também. Acabou o romantismo de tudo mesmo, né? Antes jogava bola em campo de várzea, o skatista a mesma coisa, underground pra cacete na rua. Agora é escolinha pra tudo.

O Curupira: Outra coisa que podemos citar como vantagem de hoje, em relação ao passado, é que a mulherada está mais presente nos shows e na cena como um todo. Como era nas antigas?

Bozó: Cara, até que não era assim de todo mal não, sacou? Sempre tinha aquela mais revoltadinha que andava com a gente. Mesmo as Paty gostavam da gente, olhavam os cabeludos. Só não podia admitir, né? Lógico, nos estamos em BH, né? (No passado) Uma mulher daqui iria admitir quando? ‘Nossa, eu sou afim de dar pra aquele cara’. Podia até falar pra dentro. Mas hoje em dia está bem melhor, você vê altas gatas, eu fui no show do Ozzy e do Maiden, puta que pariu, passei mal. Só linda.

O Curupira: Pegando um lado mais pessoal seu, você falou em off que é o único da banda que não tem filho porque assiste ao Jornal Nacional. Quando você fala isso é por causa da violência?

Bozó: Eu estou com 45 anos e não quero ser pai-avô, pra começo de conversa. Eu acho também que é importante ter uma boa condição financeira para criar. É muito lindo, muito romântico, mas não pode fazer sacanagem com a criança. É muito fácil você virar os olhinhos, gozar dentro da mulher, e vem um bacuri. Depois a criança fica com avó, são raras as mães de verdade que vejo atualmente. Hoje em dia tem muito egoísmo. E é tanta sacanagem que eu vejo no Jornal Nacional, tanto trem atrapalhado, e não é só a questão humana. O lado ambiental também está complicado. Um exemplo é a Serra do Cipó (um paraíso natural, na região central mineira), eu ia desde pequeno, dos 7 aos 16 anos. Fiquei 15 anos sem ir e quando voltei deu depressão. Tudo cheio de casa, de gente, perdeu muito da magia. Enfim, acho que hoje em dia tem que ter muita estrutura emocional e financeira para ter um filho. Não é ser escroto nem nada, é pé no chão mesmo. Se for pra ter um filho no mundo, eu quero que ele seja feliz, tenha tudo. Eu sei que se eu tiver um (filho), ele vai ter menos do que eu tive.


Clique AQUI e confira a segunda parte da entrevista com Bozó.





Escute na integra, a primeira parte da entrevista com o Bózo - Overdose.



Assista ao video Ultima Estrela do Overdose, ao vivo em 1985.

6 comentários:

  1. é muito bom ver um dos representantes do início do metal mineiro dando seu ponto de vista e falando de música hoje!!! Viva o metal nacional!!!

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    1. Valeu pelo seu comentario, Andre Rocha! Salveo Metal Nacional!
      Abraco!

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  2. Eu era uma das revoltadinhas que andavam com eles, he he!

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    1. Obrigado por seu comentário! E continue acompanhando a cena!!!
      Abraço!

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  3. Esses caras das antigas são muito foda,hoje em dia eles devem ver o funk e perguntar:Que porra é essa?

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  4. Sensacional a volta da banda Overdose cara!
    Veja nesta matéria aqui:
    http://www.duniverso.com.br/lenda-overdose-voltou/

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