segunda-feira, 23 de abril de 2012

O Curupira foi: Flaming Hell III

Quinta-feira, 19 de abril, Dia do Índio. Num país em que manifestações culturais só chamam a atenção quando têm origem gringa, como Saint Patrick´s Day, Halloween, a data facilmente passa despercebida. Mas neste ano houve uma analogia que ameniza o descaso do brasileiro com suas origens. Mas não foram índios os contemplados, e sim mexicanos – originais e “genéricos”. Ao invés de cocares, tacapes e tambores, bandanas, guitarras e o famigerado machetazo municiaram os protagonistas. Mas o mesmo grito libertário de guerra, executado por nossos ancestrais, ecoou na semana passada, graças à baderna organizada apresentada pela lenda Brujeria, além dos convidados. O show fez parte da terceira edição do Flaming Hell, que teve também a escalação das bandas Possuído Pelo Cão e Colt 45. Desta vez, o público, se não lotou a casa, pelo menos compareceu em número plausível. Na segunda apresentação o local já estava satisfatoriamente abastecido por bangers ávidos por uma quebradeira saudável. Talvez pela visibilidade do fenômeno headliner, ou da mistura de “tribos” na noite, no fim das contas é sempre melhor andar esbarrando nas pessoas do que com espaço de sobra em eventos desse porte. Sinal de que estão suportando a parada, pena ter sido uma cena muito rara nos últimos tempos. Não obstante, há luz no fim do túnel...

Quem ciceroneou a noite foram os mineiros do Colt 45. Marcelo Santana (voz), Rafão Reis (baixo), Tiago Carvalho (bateria), Luis Monteiro e Caio Ribeiro (guitarras) fazem um som bem pesado, carregado nos graves. Uma proposta bem moderna, fica meio chato rotular, mas é possível classificar o som como deathcore, apesar de algumas passagens flertarem com o thrash. Uma apresentação coesa, cheia de vigor. A única falha ficou na opção dos caras em como aproveitar o tempo disponível. Solos de bateria já são dispensáveis quando a banda é grande – nós comentamos isso semana passada, quando Donald Tardy ficou punhetando com as baquetas, como de costume – imagina quando o espaço ainda não foi conquistado. Isso sem falar em tocar cover. Oportunidade para aparecer frente ao público da sua cidade, em show grande, não aparece sempre. Da próxima vez, que o grupo coloque mais material próprio. É só uma dica.
Logo depois os candangos politizados do Possuído Pelo Cão sobem ao palco. Trata-se de um projeto paralelo de dois músicos de bandas renomadas na cena underground nacional: Violator e DFC. Poney Ret (vocal) e Túlio Swanker (baixo) são acompanhados pelos parceiros Lucca Novato, Barbosa (guitarras) e Tubarões (bateria). A proposta é aquele crossover quiçá vintage, com muita influência norte americana, principalmente os primórdios do D.R.I., também S.O.D., Cro Mags etc. Bandas homenageadas no palco, como Slayer e Dorsal Atlântica também fazem parte do tempero. Acordes rápidos, gritos às vezes ininteligíveis, e energia de sobra. Letras como Ugly Inside Too e Catholic Beast, evidenciam e criticam as mazelas de nossa sociedade, tão eficiente em despertar a fúria de quem sobrevive com ela. Uma pena poucas bandas não aproveitarem o intelecto para manifestar o repúdio aos nossos governantes, cada vez mais voltados para o próprio umbigo e fodendo com esse país.

Desabafos à parte, hora da atração principal. O que Belo Horizonte recebeu semana passada, a segunda vez na história, foi a presença de um dos projetos mais legais da cena mundial. Hoje em dia, algumas bibliografias ajudam bastante no olhar científico sobre a manifestação cultural. Monografias (inclusive a minha) foram feitas inspiradas de alguma forma pelo “feitiço” heavy metal. Nos textos, a unanimidade impera quando se afirma que o movimento surgiu como uma resposta a um grupo social dominante. A negação religiosa e o culto ao grotesco alimentaram, de forma subjetiva, muitos jovens da época, pois eles sabiam que esses eram alguns pontos fracos da sociedade que os subjugava. Nesse contexto, muitas bandas surgiram levando o ideal a sério demais, ou nadando na raia oposta, sem responsabilidade alguma. Daí quando surge um bando de malucos querendo adorar o diabo e justificar o tráfico de drogas, tocando música extrema, o tiro é certo. Juan Brujo, Fantasma, Pinche Peach (vozes), El Cynico (baixo), Hongo Jr. (bateria) e Guero El Viey (guitarra) sabem disso. Logo de cara Pito Wilson, música que abre o disco Raza Odiada com a morte de um político norte-americano, avesso à invasão de mexicanos em seu país, durante um discurso.
E vale uma pergunta: existe banda “pula-pula” mais bacana que o Brujeria? Musicalmente falando, os caras vão do defão pesado e rápido até o mais envolvente acorde repetitivo da guitarra, com a bateria no esquema bumbo-chimbal-caixa-prato. Como exemplos, a nervosa Colas de Rata e a cansativa Brujerizmo foram executadas na noite. O que vale mais destacar é a postura dos músicos. Há muito tempo toda a aura de mistério que pairava dissipou-se. Mas, no ínicio dos caras, em 1990, tudo era nebuloso. Até hoje não se sabe ao certo se Juan Brujo e Fantasma, os big bosses do grupo, realmente tinham envolvimento com o cartel meliante da conexão Colômbia/México. Mas a identidade não manteve essa névoa. À exceção da dupla citada, o resto todos os fãs já sabem quem são e de onde vieram. E adoram! Uma coisa que ficou meio sem entender é que a banda apresentou um line up para a tour e tocou com outro. O baterista El Podrido (Adrian Erlandsson, que tocou no At the Gates), e o “Midas” Hongo (Shane Embury, Napalm, Lock Up, Insidious Disease e outras dez bandas legais) apesar de escalados, não vieram. Os suplentes foram o já conhecido de BH, Hongo Jr. (Nick Baker, Lock Up, Testament, Dimmu e outras mil) e um camarada com cara de roadie cujo nome
lá em cima nem sei se foi escrito corretamente. De qualquer forma a festa foi garantida, principalmente após a quarta música, quando o único unmasked aparece no palco e não sai mais. Pinche Peach, se tivesse os pés virados, poderia dizer que veio da floresta, assim como esse webzine. Seu visual remonta a um ancestral do Curupira que, de tão feio, teve o nome esquecido. Sem brincadeiras, Pinche sabe muito bem cativar o público, uma prova foi a cabeça que simboliza o polêmico Matando Gueros ser o principal brinquedo do quase diabão. Brujo teve seu mic avacalhado algumas vezes, outras não conseguia cantar mesmo. Cynico visualmente relembra um Jeff Walker não no Carcass, mas na mistubera de metal com country inventada pelo britânico, chamada Und Die Fluffers. Fantasma também tem seu carisma como vocalista, assim como o abominável monstro das baquetas, Hongo Jr. Teve de tudo, passinhos executados pelo trio de frente, Brujo com o facão (ou machetazo) nas mãos, durante a execução de Matando Gueros, e o final com a chata pra cacete, mas indispensável, porcaria eletrônica chamada Marijuana. Dizem que tem disco novo pra ser lançado este ano, vamos aguardar. De qualquer forma, foi uma noite marcada pela diversão. Parabéns a 53HC por organizar um trabalho desse nível e por continuar abastecendo a cena. Boa organização é essencial para que o evento seja um sucesso. Mas é melhor parar por aqui. Frente aos últimos acontecimentos, vamos falar muito sobre isso em breve...


Set Lists:

Colt 45

1-Intro

2-Divine Human Disease

3-Cativeiro

4-The Exhumed Leprous Body

5-Solo bateria

6-A Subjective Disembowelment

7-Grind

8-Troops of Doom (Sepultura cover)

9-Juggernaut

Possuído Pelo Cão

1-A Marcha do Cão

2-Ugly Inside Too

3-Air Mail Surgery

4-Catholic Beast

5-Demo(n)cracy

6-Policial de Cu

7-Too Fast to Die

8-Antichrist (Slayer cover)

9-Toxic Possession

10-Mosh Jocks

11-Anarco Cops

12-Semen Churches

13-Blame Satan

14-Possuído Pelo Cão

Brujeria

1-Pito Wilson

2-El Desmadre

3-Marcha de Odio

4-Colas de Rata

5-Cruza la Frontera

6-Mecosario

7-Vayan Sin Medo

8-Brujerizmo

9-La Migra

10-Anti-Castro

11-Revolucion

12-Intros/No Aceptan

13-Hechando Chingazos

14-Division de El Norte

15-La Ley de Plomo

16-Consejos Narcos

17-Matando Gueros

18-Marijuana

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